Pelo menos metade desse recurso, que vem do Fundo Setorial do Audiovisual, já está garantida.
Não faz mais de 15 anos que Londrina passou a produzir cinema. Graças aos esforços de um grupo de jovens que fundaram a Kinoarte em 2003, foram filmados os primeiros curtas. Logo vieram prêmios e o reconhecimento nacional. Foi tudo muito rápido. Em 2014, a cidade rodou o primeiro longa-metragem, Leste Oeste, exibido em 2016. A partir de então, o que era diletantismo para a maioria dos envolvidos tornou-se negócio.
Londrina tem atualmente ao menos sete produtoras, um APL (Arranjo Produtivo Local) e um núcleo de audiovisual, o NAV, que integra o Programa Empreender da Acil (Associação Comercial e Industrial de Londrina).
Se todos os projetos hoje em desenvolvimento forem aprovados, o setor irá trazer R$ 12,6 milhões para a cidade, dinheiro do FSA (Fundo Setorial do Audiovisual). Desse valor, R$ 4 milhões já estão garantidos e foram repassados ao Município. Outros R$ 2 milhões também já aprovados para três projetos da Kinopus Audiovisual, produtora que pertence aos cineastas Rodrigo Grota e Guilherme Peraro.
A dupla já trouxe para Londrina outros R$ 3,3 milhões, utilizados no longa Passagem Secreta e nas séries para a televisão Super Família e Brincando com a Ciência.
Além do dinheiro muito bem-vindo, a atividade de audiovisual abre muitas oportunidades de trabalho, a maioria delas temporárias. Numa filmagem de longa, que dura cerca de seis semanas, trabalham mais de 50 pessoas.
E tem gente vivendo exclusivamente de cinema, o ano todo, em Londrina. “Todo dinheiro que a gente recebe do fundo é investido aqui”, conta Peraro. Desde a pré-produção até a distribuição do filme, há trabalho para muita gente. Roteiro; direção de produção, de fotografia, de arte; assistência de direção, de fotografia, de som; trilha sonora, desenho de som e mixagem, som direto, figurinos, maquiagem, projeto gráfico, tradução, edição de som e de diálogo, cenário, locação… Não tem fim a lista de funções que envolvem a produção de um filme. “No último, gastamos R$ 16 mil com serralheiro e carpinteiro”, conta.
O cineasta diz que as regras para utilização do fundo visam à distribuição do dinheiro pelo maior número de pessoas e empresas. “A produtora não pode ficar com mais de 10%. Se os produtores comprarem equipamento com dinheiro do FSA têm de doá-los a uma ONG depois da conclusão do trabalho”, explica. Essa é uma forma de incentivar a produtora a alugar equipamentos e contratar serviços de terceiros.
Até 2012, lembra Pegoraro, não havia equipamentos para cinema em Londrina. “A gente trazia tudo de Curitiba ou São Paulo.” Conforme a produção local cresceu, os fornecedores começaram a se estabelecer. “Hoje a gente tem tudo aqui.”
Da pré-produção à distribuição: trabalho para muita gente
Até 2014, Felipy Andrade, da Overdub, trabalhava com produção musical de bandas da cidade. Naquele ano, ele foi contratado para seu primeiro projeto de audiovisual. Fez mixagem e finalização de som do filme O Nadador, de Rodrigo Grota, produzido pela Kinopus. Depois disso, essa acabou se transformando na atividade principal da empresa. Ele investiu R$ 50 mil em um equipamento para mixagem 5.1.
Entre outras coisas, o trabalho de Andrade e de outros três colegas da empresa consiste em fazer sonoplastia, dublagem e retirar ruídos dos filmes na pós-produção. “Nós temos trabalho o ano inteiro nesta área de audiovisual. Estamos com três projetos simultâneos, dois curtas e um longa-metragem”, conta.
Há dois anos, o jornalista Luciano Paschoal deixou o emprego de professor universitário para dedicar-se integralmente à sua produtora, a Vertigo Filmes. Um dos principais projetos dele hoje é o filme “O Bispo e o Artista – A Incrível Herança Cultural dos Irmãos Sigaud”, em processo de finalização.
Paschoal também é presidente do NAV (Núcleo do Audiovisual de Londrina), ligado à Acil (Associação Comercial e Industrial de Londrina). “Nós resolvemos nos juntar para ter essa parceria com a Acil e nos aproximarmos dos empresários. Não vivemos só de editais. No dia a dia também fazemos vídeos publicitário e institucionais”, conta. O núcleo é composto de sete produtoras.
Outra que vive exclusivamente do cinema é a advogada Lilian Stanke. Especializada em direito autoral, ela voltou de São Paulo para Londrina para atender a produção local de audiovisual. “Montei uma empresa de consultoria jurídica só para trabalhar com esse pessoal”, conta. Segundo a advogada, trabalho é que não falta na cidade, tanto que, em breve, terá de contratar alguém para trabalhar com ela.
O cinema oferece muitas outras oportunidades de trabalho remunerado na cidade. “Temos de contratar roteirista, pessoal de figurino, muitos técnicos. Um diretor de fotografia, por exemplo, vai precisar de dois câmeras. E cada um dos câmeras vai ter dois assistentes”, conta o cineasta Guilherme Peraro.
Setor luta para que governo mantenha fundo
Segundo o site da Ancine (Agência Nacional de Cinema), o orçamento do FSA (Fundo Setorial do Audiovisual) para este ano é de R$ 724 milhões. O valor vem caindo nos últimos anos. Em 2014, era de R$ 1 bilhão. A dúvida do setor é se o governo do presidente Jair Bolsonaro, contrário aos incentivos fiscais à cultura, vai mantê-lo e em que condições.
“Quando o Temer (ex-presidente Michel Temer) assumiu, houve uma conversa de que o governo iria segurar o dinheiro do fundo”, conta o cineasta Guilherme Peraro. Mas, o programa foi mantido.
Peraro explica que o FSA é formado pelos recursos do imposto Condecine, cobrado de toda a cadeia produtiva do audiovisual e também das empresas de telecomunicações. Assim que os projetos são aprovados, o governo repassa o valor total para o proponente. “Nós temos 18 meses para pagar. O governo entra como sócio do filme. Fica 50% para a produtora e 50% para o governo. No começo, metade da renda da bilheteria vai de volta para o fundo. Conforme a gente vai pagando, a parte do governo na sociedade do filme vai diminuindo e a gente vai repassando menos.” Quando o projeto vai mal na bilheteria, parte do recurso acaba ficando a “fundo perdido”.
O cineasta afirma que um filme considerado de baixo orçamento vai até R$ 1,5 milhão. Acima disso já é tido como de alto orçamento. Normalmente, as produções no Rio e em São Paulo, giram em torno de R$ 3,5 milhões.
Mas há super produções brasileiras que custam muito mais. O orçamento do Tropa de Elite 2 foi de R$ 14,5 milhões. E o filme faturou mais de R$ 100 milhões. Se tivesse sido financiado pelo FSA, o dinheiro teria voltado rápido para os cofres do governo.
Hoje, de acordo com Peraro, o setor luta para que o governo Bolsonaro mantenha o programa. E para convencê-lo a isso, está sendo elaborado um estudo detalhado sobre o impacto da atividade audiovisual na economia brasileira.
Cresce público e número de salas de cinema
Apesar da crise econômica, da TV por assinatura e dos serviços de streamming, aumentou bastante o número de brasileiros que passaram a ir ao cinema nos últimos anos. Em 2009, foram vendidos 112,6 mil ingressos no País. Já em 2017, esse número subiu para 181,2 mil – aumento de 60%.
O número de cinemas cresceu 53%. O Brasil tinha 2.110 salas em 2009 e 3.223 em 2017. Os dados são da Ancine (Agência Nacional de Cinema).
A má notícia é que o cinema nacional ainda é pouco visto. Somente 9,5% dos ingressos vendidos em 2017 foram para produções brasileiras. Essa proporção era maior em 2009 (14,2%).
Apesar disso, o número de títulos nacionais lançados praticamente dobrou no período – de 84 para 160. A renda por filme foi 5,4 vezes maior nas produções estrangeiras: R$ 8,1 milhões contra R$ 1,5 milhão por título brasileiro em 2017.
Fonte: Folha de Londrina
Foto: Saulo Ohara
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