Ministério Público Federal denuncia o ex-governador e mais 32 por esquema de R$ 8,4 bilhões nos pedágios do Paraná. As ações criminosas foram definidas pelos procuradores do MPF como “o maior desvio de dinheiro da história do Paraná”
O ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB), seu irmão Pepe Richa, que foi secretário de Estado da Infraestrutura e Logística, e outras 31 pessoas foram denunciados nessa ontem (28) por corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e pertencimento a organização criminosa.
Segundo a força-tarefa tarefa da Lava Jato, os acordos ilícitos somam R$ 8,4 bilhões, desviados por meio de supressões de obras rodoviárias e aumento de tarifas em concessões de pedágio. A acusação disse que se baseia em provas de rastreamento financeiro, e-mails e palavras dos colaboradores, como o ex-diretor do DER (Departamento de Estradas de Rodagens) Nelson Leal Jr. e o ex-presidente da Econorte, Hélio Ogama. Ambos estão presos desde o ano passado, quando foi deflagrada a Operação Integração. O ex-chefe de gabinete de Richa, Deonilson Roldo, é outro denunciado que também segue detido por conta da Integração.
Beto Richa está preso desde a última sexta-feira (25) no Regimento de Polícia Montada Coronel Dulcídio, da PM (Polícia Militar), no bairro Tarumã, em Curitiba. Seu contador, Dirceu Pupo, também foi detido, mas levado à Casa de Custódia, em Piraquara, na região metropolitana da capital. As duas prisões são preventivas, isto é, sem prazo determinado.
O MPF (Ministério Público Federal) apresentou duas denúncias diferentes. Os crimes são relacionados às investigações da Operação Integração, desdobramento da Lava Jato. Uma delas é contra os irmãos Richa, acusados de comandar o esquema de propina das seis rodovias do Anel de Integração, e mais oito agentes públicos.
A outra acusação, relacionada a empresários, envolve os ex-presidentes das concessionárias Econorte, Viapar, Ecocataratas, Caminhos do Paraná, Rodonorte e Ecovia. O ex-diretor regional da ABCR (Associação Brasileira de Concessionária de Rodovias) no Paraná João Chiminazzo Neto foi denunciado como principal operador financeiro do esquema criminoso.
Segundo o MPF cita na denúncia, “no decorrer das investigações, concluiu-se que os esquemas de corrupção se complementavam, sendo que João Chiminazzo Neto era o operador financeiro de propina das concessionárias e fazia entregas mensais a diversos agentes públicos, estando entre esses funcionários Maurício de Sá Ferrante, Antonio Queiroz ‘Cabeleira’ e José Stratmann, todos da Agepar (Agência Reguladora do Paraná, responsável por avalizar o valor das tarifas), como também Aldair Petry, da Secretaria de Infraestrutura e Logística que, por sua vez, fazia a distribuição para José Richa Filho, Nelson Leal Junior, além de outros agentes públicos do DER/PR e a Luiz Abi Antoun. Este último (primo de Beto Richa), a seu turno, repassava valores em proveito do ex-governador Beto Richa.” Ferrante, “Cabeleira”, Stratmann e Petry também estão entre os denunciados pelo MPF.
Subornos
Conforme o MPF, os citados pagaram subornos de até R$ 35 milhões para obter favorecimentos contratuais que excluíam obras e aumentavam tarifas. “É a mesma coisa do caso Petrobras: captura indevida do Estado por interesses privados. Esses agentes públicos chamavam propina de ajuda de campanha, mas havia contraprestação. Eles beneficiavam as concessionárias de modo indevido”, contou o coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol.
De acordo com o procurador da República Diogo Castor de Mattos, esse “é virtualmente o maior desvio de dinheiro já comprovado da história do Paraná”. O esquema teria começado em 1999, na gestão do ex-governador Jaime Lerner (1995-2002), então filiado ao PFL, hoje DEM, e passado pela administração Roberto Requião (2003-2010), do MDB. Em razão da corrupção, o órgão estima que as tarifas nas estradas foram elevadas e menos de 25% das obras contratadas foram executadas.
Em relação aos demais ex-governadores, o procurador argumentou que do ponto de vista criminal existe prescrição. “Há uma situação de extinção de punibilidade. Mas na parte de improbidade administrativa, o ressarcimento do dano causado é imprescritível. Ainda há possibilidade [de responsabilização]”, explicou.
O prazo máximo da prescrição criminal seria de 20 anos. “Se o cidadão completa 70 anos, já reduz para a metade”, acrescentou, em referência a Lerner e Requião. “Uma coisa que nós da Lava Jato temos batido é que, se queremos combater a corrupção, precisamos mudar as regras prescricionais”, defendeu Dellagnol.
Gilmar Mendes
O coordenador no MPF argumentou que a prisão de Richa não descumpriu decisão do ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), que em setembro ofereceu salvo conduto ao tucano, pois fatos novos a tornaram “imperiosa”. “Houve pagamento de propinas recentes (…) Além disso, existiu um risco específico, que foi a tentativa de interferir nas investigações. Em agosto de 2018, um agente [Dirceu Pupo], em nome do Richa, procurou um corretor de imóveis para influenciar em seu testemunho”.
Segundo Mattos, houve participação de outros familiares de Richa, como a esposa, Fernanda, e os filhos, em irregularidades, entretanto, o domínio da ação não parte deles. “Inclusive e-mails apreendidos comprovam que em toda decisão em relação aos imóveis a palavra final foi do ex-governador. A pessoa que tinha o poder de comando e praticou diretamente os atos de obstrução da investigação foi ele”, comentou.
Rastro de morte
Para Deltan Dallagnol, além do prejuízo financeiro, o esquema nos pedágios deixou um “rastro de morte” no Estado. Ele destacou que, segundo a PRF (Polícia Rodoviária Federal), nos últimos cinco anos houve 1.714 mortes em rodovias federais, sendo 403 em colisões frontais em trechos de pista simples.
“A grande maioria dessas mortes poderia ter sido evitada. A falta de fiscalização, de ética e de uma justiça efetiva tem gerado um ambiente favorável a muitas mortes. Parecem acidentes, mas não são”, afirmou Dellagnol. “São 1.714 lares enlutados, ao custo da má gestão e da não observância dos termos contratuais”, completou o superintendente da PRF, Ismael Oliveira.
Via Folha de Londrina
Foto: Rodolfo Buhrer/Fotoarena
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