Primeira força de segurança externa a chegar no Rio Grande do Sul para reforçar o salvamento das vítimas das enchentes, o Corpo de Bombeiros do Paraná fez a primeira troca de equipe no estado vizinho nesta quinta-feira (9). Após sete dias atuando no resgate de vítimas e apoio operacional, 34 bombeiros retornaram ao Paraná. Para rendê-los, o Corpo de Bombeiros o enviou um novo efetivo ainda maior: são 37 militares para mais sete dias de apoio no pior desastre da história do Rio Grande do Sul.
Nesse período, a primeira equipe fez mais de mil resgates, entre pessoas e animais, além de entrega de materiais de higiene e limpeza, medicamentos e alimentos. A equipe também apoiou outras forças de segurança com transporte médico e de militares.
Mesmo com experiência em ocorrências de grandes proporções – como o rompimento da barragem em Brumadinho (MG) em 2019 e a queda de encostas em Petrópolis (RJ) em 2022 –, os bombeiros paranaenses que retornaram do Rio Grande do Sul afirmam que essa é a tragédia de maior proporção em que atuaram.
“É difícil comparar uma tragédia com outra. Mas o que posso dizer é que essa ocorrência no Rio Grande do Sul atingiu o estado inteiro, nem tem como dimensionar”, resume o sargento Angelo de Souza, um dos bombeiros que retornou da missão em solo gaúcho e que também esteve em Brumadinho.
Já o tenente Pedro Rocha de Faria, que atuou em incêndios no Pantanal e no desastre de Petrópolis, afirma que essa foi a primeira ocorrência em que a equipe teve que atuar de imediato, assim que chegou, mal dando tempo de fazer um planejamento prévio da operação.
“Essa foi a primeira ocorrência que participei em que as pessoas demandavam ajuda tão iminente. Na cidade de Eldorado do Sul eu botei o pé na água e uma criança já veio me perguntar se a gente iria resgatar o pai dela que estava numa escola mais adiante, dobramos a esquina, e mais gente veio pedir ajuda. E assim foram várias vezes. Onde a gente passava, alguém pedia ajuda”, detalha o tenente.
Só o helicóptero enviado pelo Governo do Paraná realizou 151 salvamentos no período de cinco dias – média de 30,2 ocorrências diárias. Copiloto da aeronave, o capitão Alexandre Ferelli compara o cenário da enchente no Rio Grande do Sul ao de uma guerra. Em especial no bairro Mathias Velho, na cidade de Canoas, na Grande Porto Alegre.
“A maior complexidade era a quantidade de aeronaves sobrevoando uma área pequena. Conversando com outras equipes de voo, todo mundo dizia que nunca tinha visto algo assim. Eram 20 aeronaves sobrevoando ao mesmo tempo uma área um pouco maior do que o bairro Boqueirão, em Curitiba”, compara o bombeiro.
Feirelli afirma que já nas primeiras 48 horas de operação a equipe aérea realizou mais de 50 resgates. “Já nas primeiras horas resgatamos pessoas que estavam um, dois dias ilhadas nos telhados das casas. Um das vítimas estava há dois dias pendurada em uma árvore”, conta o capitão.
O resgate que mais o marcou foi de um rapaz e duas senhoras do telhado de uma residência no município de Lajeado, sendo que uma das mulheres estava inconsciente por hipotermia, o capitão foi informado pelo jovem de que o pai dele estava pendurado em uma árvore mais adiante há dois dias e meio. Durante o salvamento da família, o helicóptero sobrevoou a área e realmente constatou o homem de pé em um galho na copa da árvore cercada pela água. Nesses dois dias e meio, o homem diz ter se alimentado do fruto parecido com uma goiaba da própria árvore.
“Quando você resgata uma pessoa que está há dois dias e meio sem nada, em cima de uma árvore, com vento, correnteza passando embaixo, temperatura gelada, uma pessoa que perdeu tudo e está lutando pela vida, a gente nem tem palavras de como isso deu forças para a gente continuar operando o resto dos dias”, afirma Feirelli.
PRIMEIRO APOIO – Chefe da força-tarefa paranaense no Rio Grande do Sul semana passada, o capitão Eduardo Hunzicker afirma que muitas vezes a equipe do Corpo do Bombeiros foi o primeiro socorro a chegar às vítimas das enchentes.
Além da demanda muito alta, o capitão afirma que outra dificuldade da missão era para onde levar as pessoas resgatadas. “No planejamento de resgate a gente espera ter local com estrutura para levar as vítimas. Mas lá no Rio Grande do Sul estava tudo comprometido. Conseguíamos pôr as pessoas apenas em situações relativas de segurança, porque tínhamos que deixá-las somente em um lugar seco para ir buscar mais vítimas”, ilustra o chefe da força-tarefa.
A cabo Irineia Pauluch afirma que o quadro era um verdadeiro caos, tamanho o estrago das águas. “A gente passava nas ruas e as pessoas vinham pedir pelo amor de Deus para a gente salvar o pai, a mãe, a avó delas. As pessoas gritavam por socorro enquanto salvávamos outras pessoas, que estavam em situação de mais risco. Essa gritaria das pessoas me marcou”, recorda.
A situação era tão crítica que as vítimas resgatadas nem sabiam para onde ir. “As pessoas não sabiam para onde ir e nem quem poderia ajudá-las. Vi pessoas saindo de casa só com uma sacolinha de no máximo duas peças de roupas”, afirma a cabo.
AEN
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